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Ciclo dos alimentos
Ciclo dos alimentos

Até a meio do século passado as práticas e ciclos relacionados com as práticas agrícolas repetiam-se do mesmo modo ao longo dos anos, pois não havia empregos, as pessoas viviam quase exclusivamente do cultivo da terra, e, desta actividade, retiravam os alimentos necessários à sua subsistência; também os acessos e os transportes eram escassos até há poucos anos.

A partir dos anos sessenta e setenta com o desenvolvimento do País, houve uma melhoria das vias de comunicação que permitiram chegar novos alimentos, informação, influenciando e mudando os hábitos e as tradições da grande maioria da população rural. A par destas mudanças, a forte emigração de população jovem tanto para o estrangeiro como interna, levaram a que cada vez menos pessoas trabalhassem na agricultura. Esta ruptura em larga escala é responsável pela perda de tradições, associadas à gastronomia, celebradas nas regiões da Beira Interior.

No entanto para se compreender o que está na base do que se designa por Gastronomia da Beira Interior, convêm saber quais os alimentos mais cultivados e em que épocas, pois no geral os alimentos mais consumidos estavam em harmonia com os ciclos de produção.

 

O Ciclo do Milho

A cultura do milho decorre no período de Primavera-Verão, quando as temperaturas são mais elevadas. A sementeira é feita nos princípios de Maio. Um mês depois é sachado para tirar as ervas daninhas e mondado. Em Julho começam as regas. Há um sistema de regadio que desde sempre, e ainda hoje, tem sido motivo de muitas zangas nas aldeias. A água disponível para a planta durante o seu desenvolvimento é determinante para garantir uma boa produtividade.

Em fins de Setembro, princípios de Outubro cortam-se as canas do milho, que são transportadas para a eira  da aldeia no carro de bois. È nesse local que tem lugar a desfolhada. À medida que se desfolha o milho, vão-se amontoando as espigas em cestos de verga que, quando estão cheios, são despejados no canastro ou espigueiro.

Na desfolhada são separadas as espigas de milho (ou maçarocas) das plantas. Apesar de parecer uma festa, é um trabalho árduo e cansativo para todos os que nela participam. Mesmo assim, até os mais novos participam, interessados, nas desfolhadas, na expectativa de encontrarem milho-rei ou rainha para poderem dar um beijo ou um abraço à namorada.

O milho-rei é a espiga vermelha. Quando alguma das pessoas que participam na desfolha encontra esta espiga, tem que dar um abraço a todas as pessoas presentes. A desfolhada termina sempre com uma festa, na qual todos participam com grande entusiasmo.

 Uma vez seco o milho, utiliza-se para consumo humano no fabrico da broa de milho, mas também para alimentação de alguns animais, em grão no caso das galinhas e em forma de farelo (que se adiciona a água, couves torcidas, botelha, cascas de batatas, cebolas, etc.) para servir de alimento aos porcos, constituindo aquilo que se designa habitualmente por lavagem dos porcos.

Era normal fazerem-se 12 a 15 broas, conforme a família, dar para 8/10 dias. Se se acabava antes de se poder cozer de novo, pedia-se uma broa emprestada à vizinha, com retorno posterior.

 

      O Ciclo do Centeio

Normalmente era cultivado nas encostas, onde cresciam matagais, e que não tinham aptidões para outras culturas. Semeado em Outubro depois de fertilizada a terra. Em Junho ceifava-se o cereal e transportava-se para a eira. Em Julho e Agosto malhava-se o centeio e moía-se para se fazer a farinha, que depois teria os mais variados usos culinários.

Muitas vezes foi um cereal bastante consumido, em forma de pão de centeio. Este era considerado um cereal pobre, e o mais acessível às pessoas de menores recursos económicos.

 

O Ciclo da Batata

Em Portugal, a batata veio substituir, nalguns locais, a castanha. Como aconteceu em algumas áreas da Beira Interior.

A batata é semeada em Abril, depois de estrumada e cavada a terra. Demora cerca de três meses a criar-se, e precisa de ser sachada e regada.

 

O Ciclo dos Vegetais:

  • ·              A Hortaliça

      A maioria das hortaliças era semeada e plantada nas hortas das próprias pessoas, normalmente na terra das batatas. Como não era fácil encontrar os “pés” (planta já crescida e tirada dos canteiros directamente para o lugar definitivo) para dispor, guardavam-se as sementes de um ano para o outro.

      Durante todo o ano as hortas produziam as mais variadas verduras, estes são alimentos que estão na base de uma série de receitas, tanto nas sopas como nos pratos de carne ou peixe.

  • ·              Leguminosas

      Os feijões e o grão são semeados pelo meio do milho, e o feijão de trepar em leiras com canas ou paus para se apoiar.

 

O Ciclo da Castanha

A castanha desempenhou um papel importante na alimentação das populações das Beiras, Beira Alta e Beira Baixa, principalmente antes da divulgação da batata e do milho.

Os castanheiros foram abundantes em toda a beira Interior.

A apanha ou varejo (bater com um pau ou vara para caírem) da castanha começa em fins de Outubro, princípios de Novembro, à medida que os  ouriços vão ficando amarelos e vão abrindo. Tendo ainda uma relação indissociável na gastronomica de várias datas festivas, como o Dia de Todos os Santos e Fieis Defuntos e o S. Martinho.

Normalmente eram comidas assadas, nos tradicionais magustos. Eram momentos de alegre convívio entre pessoas de todas as idades, tanto em família, como com os vizinhos, dependendo das áreas e das tradições. Assavam-se ou em assadores de barro ou em caruma (folha do pinheiro). Outras eram cozidas servindo de complemento à escassa refeição ou de sobremesa. Quem tinha maiores quantidades guardava-a e deixava-a a secar cerca de três meses, uma vez secas era-lhes tirada a casca e ficava a castanha pilada. Esta era dada aos miúdos como guloseima, ou cozida em água ou leite, dando origem ao “caldudo”, forma tradicional de comer castanhas em muitas zonas da Beira Interior.

 

O Ciclo do Vinho

A cultura da videira é muito antiga, vinda do tempo dos Gregos e Romanos. Esta planta exige terrenos arenosos ou argilosos e clima seco, temperado ou tropical. Na Beira Interior a produção da vinha é muito díspar entre as várias “beiras” que a compõem, tendo assim, reflexo nas diferentes tradições e usos deste líquido, tendo produção extensiva nas encostas da Beira Transmontana com o Vinho do Porto; na Cova da Beira (toda a zona do Fundão), Vinho do Fundão; Planalto de Viseu, Vinho do Dão.

As videiras eram podadas em Janeiro e Fevereiro, conforme as zonas e depois curadas. Em Setembro e Outubro é a época das vindimas, e as uvas eram transportadas para as adegas sob as mais variadas formas, em cestos à cabeça, canastrões às costas, ou em carros de bois. Depois o sumo do esmagamento da uva era colocado em pipos e pipas para se iniciar a fermentação. O mosto era aproveitado e transferido para os alambiques (de cobre), para o fabrico da aguardente, por destilação. 

 

A Pastorícia

Boa parte da agricultura estava dependente da pastorícia, claro que nuns locais mais do que noutros, para o fornecimento do estrume. Além do estrume, o rebanho fornecia os cabritos ou borregos, e com a sua venda se obtinham outros alimentos comprados nas mercearias, ou roupa, calçado e também forneciam o leite e queijo, parte importante da dieta alimentar das populações da Beira Interior.

As cabras eram ordenhadas todos os dias, sendo o leite utilizado para o fabrico do queijo. Algumas cabritas ou “chibitas”, ou ainda borregos novos, não eram vendidos e reforçavam o rebanho, em substituição das mais velhas, sacrificadas durante as festas.

 

O Porco

O porco era comprado nos mercados de toda a Beira Interior, sobretudo nos meses de Março e Abril, e alimentado com três refeições diárias. Em Dezembro ou Janeiro realizava-se a matança, normalmente com a ajuda dos vizinhos. As tripas eram lavadas nos cursos de água e depois utilizadas para fazer os vários tipos de enchidos, de carne e de sangue, e o paio e o bucho. As pás e os presuntos eram tratados e secos ou guardados na salgadeira, tal como outras partes do animal, para consumo ao longo do ano.

 

As Aves

As aves de capoeira faziam parte de qualquer casa de família. Pois produziam os ovos, utilizados na confecção de sobremesas, assim como, de sopas, bolas e folares, entre outros pratos. A carne de galinha era cozinha principalmente para celebrar os rituais como o nascimento, o baptizado, o casamento, ou quando alguém estava doente.